Φeristā φare wenyām!

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Na ampla problemática sobre como “expandir” (principalmente de forma qualitativa), muito se debate e mesmo cá, faz anos, que interna e abertamente consideramos e debatemos sobre uma série de alternativas. Anos no “Neopaganismo” já me calejaram, e os que já conversaram comigo sobre isto sabem, gerando em mim uma repulsa a olhar para certo “público” como “conversos em potencial”, uma vez que o trabalho de “desintoxicação ideológica” tende a ser muito grande, tomando espaço e tempo que poderiam ser estendidos nos campos que realmente interessam mais. Na prática, isto nos deixou com uma opção muito limitada: zeramos a admissão de novos membros e as atividades abertas (especialmente palestras, etc. que geralmente se davam em ambientes supostamente “propícios” em termos de público-alvo, como universidades públicas), fechamo-nos no nosso núcleo familiar somente.

Se esta posição nos trouxe relativa paz e tranquilidade necessárias para o desenvolvimento de uma série de demandas doutrinais (urgentes quando se opera num contexto tão fragmentário e com lacunas aparentemente intransponíveis, como no Iberoceltismo), também é verdade que se mostrou uma posição de barreira: levantamos muros decentes, mas a porta, a principal entrada e saída, não está à altura do empreendimento; ou noutros termos, concluímos um fosso necessário em torno do castro, mas parece faltar uma ponte funcional. Coloco isto cá, como uma espécie de diagnóstico e como preâmbulo para o desenvolvimento do que parece ser, em linhas gerais e sintéticas, o que vejo como a melhor saída. Como isto afeta outros grupos, sejam de qual denominação religiosa for, não faço ideia; suspeito que nossa situação seja muito nossa e não reflita os caminhos de outros grupos. Pra piorar, em termos de temperamento pessoal, não me incomodo com isso o tanto quanto deveria, especialmente quando rápidas olhadas ao redor (em se tratando de grupos religiosos que se denominam célticos de alguma forma) não me trazem lá muita inspiração e ânimo.

Bem, então qual é a saída? A saída é uma maturada faz um tempo e será longa em termos de resultados, mas breve em termos de exposição. Creio que a saída seja o foco na família, na *wenyā: devemos ser uma religião familiar, antes de sermos uma religião para o “indivíduo”. Isto é natural quanto mais se compreende o papel do culto doméstico aos Ancestrais nas religiões Indo-Europeias, mas é algo “inovador” hoje, diante do contexto liberal, individualizado, quase solipsista, do Neopaganismo, especialmente se olharmos para o movimento da Wicca, cuja nutrição de uma “guetização”, de uma quase “marginalização” romantizada (a partir da narrativa fundacional da “perseguição”, “das Fogueiras” e da necessidade de coventículos secretos) e oposição à comunidade mais ampla, sincretizou-se com certas inventivas das subculturas juvenis dos anos 60 pra cá.

O culto doméstico é a base, sua unidade é a família e o sujeito só é protagonista, na medida que encabeça uma. Nossa religião deve dizer claramente aos solteiros: casem, estabeleçam uma *trebā em sua dimensão espiritual, gerem filhos, reatem-se aos seus Ancestrais num sentido amplo, tornando-se um elo da cadeia. Assumir o foco doutrinal na *trebā, na instrução das coisas sagradas aos filhos, no estabelecimento ao longo dos giros das Rodas do Ano gerará uma base sólida que recém converso algum, especialmente certos tipos demasiadamente afetados pelo progressismo ultramodernista, terá. Nisto também nos afastamos da lógica centrada no sujeito, no poder pessoal, de certas correntes Neopagãs que, por isto mesmo, serão “Universalistas” e opostas ao real tribalismo, de uma coletividade bem delimitada (em oposição à coletividade artificial e agigantada de certas ideologias políticas de Esquerda) que está acima do sujeito puro.

Nosso caminho deverá ser o fortalecimento espiritual e fisiológico das *wenyās, dos laços de união e lealdade mútua entre elas (e aqui, não é necessário o pertencimento ao mesmo *genos, a mesma linhagem, uma vez que a prática do compadrio – *altiyom – entre celtas fora não só tradicional como socialmente estimulada), se fundará uma *moniterā (uma comunidade local formada por laços de proteção e lealdade mútua), que habitando o mesmo local, formam uma *kom-trebyā, uma “comunidade”. Dois grupos destes pelo menos, compartilhando as mesmas tradições religiosas, serão uma *kʷlantā, um “clã” (se possuem a mesma origem genética, serão *kenetlom, uma “etnia”), da união de dois ou mais clãs, temos uma *towtā, uma tribo.

É interessante notar como tais estruturas hierárquicas de organização suprafamiliar reverberam (por nomes diferentes) entre germânicos, romanos e mesmo gregos e como na língua céltica, até podemos ver do que há disponível sobre o Proto-Céltico, a própria palavra para “povo” em sentido mais amplo e abstrato pressupõe, etimologicamente, “uma parte, uma parcela” (*luχtus “povo, conteúdo” quase que no sentido de “massa” que usamos, mas deriva do PIE *leug– “separar, tirar parte”). É interessante notar que o uso medieval na língua goidélica de alguns destes termos, obtiveram noções mais específicas, cuja compreensão é de boa valia (incluindo a dimensão jurídica que, surpreendentemente, tem sido em parte negligenciada por uma parte do “Neopaganismo” sob o aparente medo de endossar uma visão de mundo muito pouco liberal).

Faz um tempo que elaboramos uma compreensão básica de três esferas de ação religiosa: a comunitária (“tôutica”), a doméstica (“vênica”) e a pessoal. E prevíamos, faz tempo, uma certa ascensão lenta e progressiva da última para a primeira. Hoje, de maneira mais clara, digo que a dimensão do meio deve ser o foco, dela, naturalmente se preencherá o que falta da última (a pessoal) e se fornecerá uma base sólida para a primeira (a “tôutica”). Nos últimos anos, ao menos para mim, se sedimentaram mais e mais a percepção dos problemas no foco pessoal: termina-se por depositar muitas esperanças e responsabilidades no sujeito “isolado” que termina por desmotivar-se ante a enorme carga de leituras e teorias fazendo com que não aceda, além de que termina por reproduzir aquele complexo “quase-wiccaniano” de uma prática “excêntrica”, “mágica”, às escondidas, dissociada do Lar e quase “virtual”. Se olharmos para a Religio Romana, onde há uma distinção clara entre a sacra priuata (doméstica) e a sacra publica e se tem a clara noção de interdependência (ou mesmo causalidade) entre as duas, talvez o quadro se torne mais óbvio.

Parece ingênuo, parece irrealizável, afinal, vai na contramão… Mas é o que propomos: fortaleçamos a família, duas ou três famílias unindo-se propiciarão uma vida religiosa muito mais forte, estável e poderosa que 3 dúzias de sujeitos isolados esporadicamente reunidos; tal comunidade fortalecida formará um clã real, não um “de nome” ou “virtual”, a união de clãs, uma tribo. Comunidades virtuais não são a mesma coisa de comunidades reais, orgânicas, com laços de solidariedade e apoio mútuo nos momentos em que realmente se precisa.

Obviamente que isto conflita, por exemplo, com o ideal liberal moderno da laicidade na educação dos filhos – mas os que nos leem há mais anos sabem de minha posição sobre isto: na melhor das hipóteses, o ‘Laicismo’ é um escudo, não uma espada. E como temos repetido diversas vezes, mesmo como “escudo”, delegar a partidos políticos, ao “Estado”, ou ao que quer que seja que não nós mesmos, nossa proteção é um erro sério. O caminho é longo, talvez até contra-intuitivo na lógica liberal do “livre mercado” das religiões contemporâneas, mas podemos dizer que reflete um resgate de certa mentalidade pré-moderna, Tradicional. O início é pela casa, pela família, e se desejamos retomar o olhar religioso de uma mentalidade indo-europeia tribal, o resgate, ao menos no horizonte, da possibilidade de tais *towtās, não deveria soar estranho.

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