Texto originalmente publicado no blog “Ígnea Falcata” em 22/06/2015. Mantivemos a redação original, caso hajam novos comentários estes aparecerão entre chaves [] no texto.
Partindo de uma postagem para gerar debate – e gerou – na comunidade Fronte da Parahyba no Google+ [isto lá por meados de 2015], acerca de uma suposta ameaça de “vandalização” do templo ásatruar que será construído na Islândia, pelo fato dos ásatruares islandeses reconhecerem religiosamente o casamento gay, enquanto outros politeístas germânicos (e numerosos, apesar da tentativa de minimização, diga-se de passagem) não reconhecerem tal casamento e serem contrários ao reconhecimento. Como Ana bem notou [Slakkos Abonos, em um artigo em seu blog – possivelmente reapareça cá no futuro], a notícia que serviu de base para despertar o debate, tem um quê de, digamos, factóide-liberalistóide, mas diferente do que aferi do foco do texto dela, creio que não se trate somente de “interferências políticas”, mas de uma oportunidade, justamente, para iniciar uma discussão anterior, uma discussão genuinamente religiosa.
Primeiro, é mister separar a discussão sobre a natureza do homossexualismo e desta conduta na sociedade, do casamento enquanto Instituição Religiosa. Não me interessa, nem creio que deva interessar (nisto concordo com Ana, perfeitamente) discutir as condutas íntimas de quem quer que seja; não me interessa discutir o primeiro elemento, mas apenas chamar atenção para a oportunidade de refletir sobre o casamento enquanto instituição religiosa dentro do pequeno escopo do Reconstrucionismo e Religiões étnicas (não englobo a Wicca nem certos setores do Neodruidismo dentro deste escopo, é bom deixar claro).
Segundo é importante também destacar a existência de casamentos (me refiro a rito – religiosamente – lei civil é um troço posterior) em conformidade com a compreensão daquilo que os hindus chamam de ṙta e os romanos de ritus, com a “ordem cósmica”, digamos assim (ou aos partidários de uma compreensão aristotélica, chamemos de “Lei Natural”); outra coisa, diferente, é o casamento por contestação social, em especial à moral vista como hipócrita e retrógrada dos padrões aristocráticos de certas elites, em se tratando do Império Romano – é importante frisar tal diferença quando se fala da conduta de imperadores escandalosos (alguns claramente críticos de certos aspectos da religião tradicional de Roma, quando não ateizantes eles próprios) em contraposição aos ideias aristocráticos das famílias tradicionais ou mesmo à vida comum da plebe em seus mais multifacetados aspectos. Tomar um exemplo de um como generalidade de outro me parece ser um non sequitur. É importante distinguir as coisas neste sentido para não incorrer neste raciocínio sofismático. [Uma coisa é um casamento religioso tradicional, outra coisa, o casamento como ato de subversão/contestação sócio-política. O fato de ter havido exemplos históricos do segundo – sendo os mais famosos em Roma, não o tornam regra geral ou ideal religioso como concebido no primeiro tipo.]
[É famoso o reporte grego ao fato de alguns jovens mercenários gauleses apresentarem comportamentos bissexuais e não serem repreendidos pelos demais por isto, sendo algo que causara estranhamento entre os gregos].
Quanto ao testemunho de Eusébio (no livro 6 do Praeparatio Evangelica), sobre os “jovens gauleses”, citado em um dos comentários na comunidade do Google+, o trecho em questão, repete um topos literário divulgado por outros escritores gregos acerca de mercenários gauleses em longas campanhas fora de casa e que demonstravam comportamentos homossexuais. O verbo que foi traduzido por “casar” aí (fui verificar o texto grego), não tem bem nenhum sentido religioso (ou seja, não é propriamente – em termos metafísicos, “Casamento”) neste trecho; mas simplesmente denota “unir-se”, “amancebar-se”, inclusive até em tom galhofeiro e (não seria de estranhar) contestatório. Se tal prática fosse tão arraigada assim entre os Celtas, creio que teríamos bem mais – bem mais mesmo – testemunhos disto na literatura do alto medievo, pois duvido muito que os cristãos deixariam passar a oportunidade de “descer a lenha” em tal comportamento [aproveitando para rechaçar a “imoralidade” e “imundice” de tal prática entre os “pagãos”]. Ou seja, tal trecho, na melhor das hipóteses, ao que parece, descreve um comportamento socialmente aceito dentro de opções da vida juvenil, não me parece ser prova nenhuma de que druidas celebravam (religiosamente) casamentos homossexuais. [De notar que nos mais antigos épicos e registros diversos da literatura gaélica e britônica, não há lá evidências nem registros legais destas uniões como ‘Casamentos’, assim como não há informações etnográficas de tal coisa – que seria uma inovação digna de ser notada e registrada pelos gregos e romanos – entre Ibéricos, por exemplo].
E isto nos leva ao essencial: a celebração do casamento. Casamento não é Amor (seja erótico ou do tipo “philia” – como Platão bem sabia), na verdade, como toda e qualquer sociedade antiga que preconizava casamentos arranjados sabia, é possível até que haja casamento sem amor. Isto sim, de casamento sem amor, é algo que os cristãos não aceitam de jeito algum (na verdade, os cristãos dirão que o primeiro passo para qualquer casamento ser válido, é existir amor!). É crucial ver isto em tempos como os nossos, tão inebriados num modelo de casamento “burguês” (sim, pois ascendeu junto com a burguesia): o casal isolado, distanciado do clã, da família mais ampla, de poucos ou nenhum filho (o casal ideal, sem raízes, como idealizado por Rousseau no livro “Emílio”).
Para o mundo antigo (e é por isto que muita gente não entende bem os casamentos arranjados) se trata, antes de qualquer coisa, da união de duas famílias em prol da estirpe, uma união espiritual entre duas cadeias de Ancestrais. Casar para viver feliz (egoísticamente libertos de quaisquer laços clânicos ou comunitários), compartilhar uma vida estéria (sem o prolongamento – muitas vezes visto como dever sagrado, religioso, no mundo Antigo – da espécie, sem filho concebido pela união das almas e dos corpos), imersa em consumo e num cuidado patológico com “pets”, ao que me parece, não seria lá bem visto, e isto, é bom frisar, inclusive se tratando de pessoas de sexos opostos. Daí que não se deve misturar Eros – inclusive em sua dimensão transcendental – com “casamento”, são coisas diferentes como qualquer pessoa intui; pelo menos me parece óbvio, que transar com alguém é diferente de casar com alguém. Promover esta confusão não ajuda. Na verdade piora, pois maliciosamente tem gente que confunde; não se trata do comportamento homossexual (a transa), mas do casamento enquanto instituição metafísica, em sua dimensão religiosa e toda sua relação aos antepassados e a família dos noivos (e sua sansão comunitária).
[Conceber o casamento como baseado no Amor, característica mais cristã, de facto, abre muito mais margem para aceitação de casamentos gays do que a concepção arcaica centrada no Sangue, Família, Estirpe e Clã. Daí que, não deveria ser de espantar haverem mais registros de casamentos “gays” cristãos do que “pagãos” – se formos dar crédito ao polêmico e muitas vezes criticado livro “Christianity, Social Tolerance, and Homosexuality: Gay People in Western Europe from the Beginning of the Christian Era to the Fourteenth Century” de John Boswell. Sem querer entrar no mérito do livro, no caso da Irlanda cristã, precisamente, Boswell “recorta” propositalmente a descrição de um rito relatado por Geraldo Cambriense na “Topografia Hibérnica” – texto com gritante viés anti-irlandês – que, ao invés de ser de um casamento, como ele advoga, é de uma aliança de sangue entre 2 nobres, sem nenhuma conotação sexual ou marital. Apesar de atribuir aos irlandeses todo tipo de desgraça moral, Geraldo Cambriense, em termos de “casamento” relata que no caso de um homem cair gravemente doente ou morrer, poderia acontecer do irmão do finado/acometido de grave doença, seduzir a mulher do mesmo, incorrendo numa relação incestuosa, uma vez que a mulher do irmão não deveria ser tratada como uma opção sexual a se considerar]
Do mesmo modo que não se trata de uma questão de axiologia, puramente, social – não é uma questão de aretē, de excelência e virtude pessoal, seria se estivéssemos tratando do comportamento, da ação pessoal; realmente, dentro de um prisma aristotélico, tal comportamento, a priori, não impede o desenvolvimento de virtudes – apesar de historicamente, diversos povos associaram tal comportamento (a conduta homossexual) a falta de virilidade, de ombridade e frontalidade no enfrentamento de problemas ou ameças. Não creio que seja assim absolutamente, mas não posso negar que historicamente, diversos povos, em diversos momentos históricos, e não apenas cristãos ou islâmicos ou judeus, fizeram tais associações ou associações similares. Negar isto é utilizar um filtro ideológico escancarado.
[Uma vez considerado tais coisas, se vê que não há exemplos concretos abundantes para casamentos – no sentido legal e religioso – entre homossexuais seja entre Celtas, ou mesmo Gregos. O que não impede, obviamente, que tenham existido pessoas que tenham vivido juntas como “casadas”, mais ou menos marginalizadas socialmente.]
Daí que se deve perguntar: cadê os exemplos concretos do casamento religioso (que não sejam “excentricidades” de imperadores claramente antagonistas ao mos patricius ou mos maiorum tradicional)? E no caso concreto dos germânicos (afinal, o post parte disto), de conhecido viés, digamos (na falta de um termo melhor) “machista” [como exemplo, vejam o relato que Tácito faz da pena legal que uma mulher germânica adúltera sofre], onde estão os exemplos de casamentos “oficiais”, religiosos de pessoas do mesmo sexo?
Uma união não religiosa (civil) não é o que está em causa aqui, vale lembrar. Um tradicionalista/religioso poderia, coerentemente, defender o reconhecimento da união civil e a partilha de bens entre pessoas do mesmo sexo, mas, na falta de fundamento tradicional (ou no indício de fundamentos contrários) não apoiar o casamento religioso, o casamento enquanto união de estirpes (entendido religiosamente). Ele reconheceria que o que a legislação hoje aponta é uma legitimação, no âmbito civil e laico, de uniões que, mais ou menos (às claras ou às escondidas) que sempre existiram. Mas, reconhecê-las como “Casamentos” (no sentido, digamos, “tribal”, religioso) é outra coisa.
Não se trata de confusão política, mas justamente de uma reflexão objetiva que permita não ser instrumentalizado ou alocado a um bloco com o qual não temos nada a ver. É preciso ver, enxergar claramente, quando possível, como se olhássemos as águas de um val que se sujam após as passadas pesadas e rápidas, mas que se limpam após algum tempo; os pilares fundacionais da compreensão do casamento e sendo eles de origem divina, atemporais, seriam válidos pra hoje também, mesmo que isto desagradasse X ou Y. Adequar ao discurso da ultra-modernidade só para ficar do lado dos “do-bem-descolados-salvadores-do-mundo”, só por pseudo-angelicalismo [e para mostrarmos como somos cordeirinhos “obedientes” e inofensivos ao Sistema e ao Politicamente Correto] é contra-produtivo, assim como ficar contra só para posar de “malvadão-conservador-purista”.
Digamos que em relação ao requerimento de coerência com o passado, haja a possibilidade de tomarmos 3 caminhos:
- Não temos evidências de casamentos (religiosos) entre pessoas do mesmo sexo e temos evidências de mentalidade “homofóbica” dentro desta cultura povo;
- Temos evidências inequívocas ou comprovações sim de casamentos deste tipo, olha aqui (e aí se lista as mesmas);
- Não temos evidências de casamentos religiosos/oficiais e temos evidências deste tipo de comportamento com alguma sansão social.
No caso de 1, ou o sujeito deixaria claro que – RELIGIOSAMENTE – tal procedimento não deverá ocorrer (como não ocorria no passado), ficando a seu encargo a defesa ou não no âmbito civil; ou dizer que, APESAR disto não ocorrer no passado [ou seja, reconhecendo – e nisto, talvez a contragosto, dando razão aos críticos e tradicionalistas], agora pode ocorrer – aí terá de construir uma justificação (que pode ser boa ou não) e claro, terá que compreender que os que discordarem, por coerência ou purismo (ou “radicalismo”, no sentido de se apegarem as raízes, “radices”), estarão no seu direito, apesar dos pesares.
É importante frisar que a prerrogativa de que “não ocorria mas deve ocorrer hoje” caberá, logicamente, para muitas outras coisas também – incluindo misturas de práticas alógenas, etc. Na verdade, “se não havia antes mas pode haver agora” abre brecha para quase qualquer coisa. É importante que os que fazem tal opção tenham consciência do que ela acarreta muita coisa ou de antemão já construam argumentos que os eximam de incluir/reconhecer outras práticas além do caso discutido.
No caso de 2, uma vez atestado que seja uma prática instituída de forma geral (e não apenas para pequenos setores especiais ou em contextos excepcionais de uma sociedade), não há muito a se discutir – como ocorrera no passado, ocorra hoje (é interessante notar que tem gente que usa este argumento para casos assim, mas não para o caso de sacrifícios animais, por exemplo, muitas vezes demonstrando claramente sua preferência ideológica no 1 peso 2 medidas: o caso do sacrifício animal, ou da tortura de prisioneiros, ocorria no passado – dentro da sansão e mesmo prescrição religiosa – mas não deve ocorrer agora; mas já coisa X deve ocorrer agora, porque ocorria no passado…) [ou seja, “práticas muito comuns que ocorriam no passado não devem ocorrer hoje, pois eu as desaprovo”, mas “práticas pouco comuns que ocorriam no passado devem ocorrer porque eu aprovo”, replicando o pensamento tortuoso de “indignação seletiva”]. No caso de 2, tudo fica fácil, opor-se, seria incorrer num comportamento “estranho”, que seria melhor explicado por cripto-cristianismo ou outra interferência “exterior” (do conservadorismo político, por exemplo).
No caso de 3 a coisa fica mais complicada, pois como dizia alguém (que não me recordo) “falta de evidência não é evidência da falta”, apesar de que, ao menos dentro de metodologias reconstrucionistas, prudência (e certa observância da Navalha de Occam) é regra e por isto ser algo suspeito assumir certas coisas sem que haja, no mínimo, um escopo mais amplo (em termos de imaginário e visão de mundo) que justifique. Nestes casos, justamente, é onde a reflexão mais se faz necessária e o clareamento da visão é mais requerido. Por um lado, talvez caiba tanto uma certa reserva no tocante ao casamento religioso (mais ou menos como 1), como uma atitude de absorção do mundo civil/laico (para um tradicionalista isto seria coerente se já houvessem outros exemplos de tais absorções no passado ou se algo, nos mitos e literatura sagrada, relatando acontecimentos fora do tempo, assim indicasse que tais absorções ocorrem ou devem ocorrer).
[Metafisicamente, tem outra questão que pode ser puxada de diversas fontes diferentes, seja de casamentos hindus – e há adaptações, nem sempre reconhecidas por sacerdotes tradicionais, para ritos “gays” – ou mesmo das tas aphrodisias – “as coisas de Afrodite” na Grécia é a da emulação. Me refiro a questão de que, a execução do rito de casamento para gays, incorrerá, metafisicamente, numa simulação – pois a concepção, digamos, “mágico-metafísica” original, pressuporá a diferença de sexo, de modo que teremos alguém que não é o noivo emulando o Noivo ou alguém que não é a noiva emulando a Noiva. Mesmo que se troque os nomes, por nomes sem gênero, digamos, ainda sim teremos a estrutura simbólica geral, que será bipolar: e isto, para muitos homossexuais, já é o suficiente para se condenar o “heteronormativismo” do discurso religioso litúrgico marital. Alterar este heteronormativismo original para fazê-lo agradar a demandas políticas e sentimentais de hoje, poderá, com razão, ser visto como sacrilégio e/ou instrumentalização política].
Ousaria dizer que, pelo que conheço do mundo religioso Indo-Europeu ocidental, os germânicos e balto-eslavos estejam mais para 1, e todo o restante (celtas, trácios, gregos, etc.) para 3 – eu sei dos casos romanos e supostamente gregos (estes povos são referidos, constantemente, sem os devidos recortes de estratificação social, período histórico ou região/cidade; levando a generalizações inadequadas), que talvez fizessem enquadrá-los em 2, mas justamente por causa dos muitos “poréns” (no geral, pela excepcionalidade – mesmo quem lê um Satyricon da vida e especula sobre uma forma de literatura homoerótica percebe que não se trata de algo do “povão”), creio que seja um procedimento questionável. E diria até mais – talvez coubesse 2, mais para o mundo romano do Baixo Império, onde – não sou eu quem fala – a influência “oriental” e egípcia se fez mais forte. Novamente, friso que se trata de “casamento”, religiosamente, oficialmente.
O real problema, é a polarização política tosca de nossa época. Por um lado, é importante frisar que no Mundo Antigo, e em especial fora do eixo greco-romano, Política e Religião estiveram misturadas e o Eixo Perene das Tradições é orientado no sentido da Religião iluminar a Política (e ao contrário do que gente má-informada sustenta, Evola justamente insistiu na volta a esta orientação; pessoas como Faye e outros é que por vezes creem – criticando os “metafísicos” – que a Política pode ser um instrumento de afirmação religiosa, por vezes advogando que a separação entre as coisas – Política e Religião – é obra do Cristianismo e da Modernidade) e não o contrário. Se por um lado é verdade que não havia no passado uma separação muito clara entre Religião e Política (se é que havia separação), por outro lado é igualmente válido que não há um trabalho de reflexão sistemática e profunda entre os politeístas contemporâneos (especialmente entre os tradicionalistas e reconstrucionistas como um todo) dos limites e influência consciente do laicismo moderno em suas concepções.
A lógica do “e” ao invés da lógica do “ou exclusivo” (Alain de Benoist) é um bom início, mas não há muita literatura sobre o tema. E isto, nos leva ao velho modus operandi de “babação de ovo” dos norte-americanos [e é bom notar que os blogs “pagãos” mais famosos dos EUA são wiccans, em boa parte, liberals, inclusive nas últimas eleições de lá, fazendo clara campanha partidária e favorecimento de movimentos como BLM, e nutrindo uma subtil desconfiança de que tudo o que não está fazendo propaganda antirracista 24 horas por dia, todo dia da semana, é porque deve ser racista/nazi], do provincianismo intelectual que se repete quase que como reação mecânica, automática.
Ou seja, se por um lado, dentro de uma perspectiva laicista, seria ideal “não misturar as coisas”, por outro lado é uma tarefa difícil (mesmo para esta perspectiva laicista) quando as coisas estavam misturadas no passado e mesmo hoje permanecem de alguma forma – pois, em se tratando de casamento religioso, litúrgico, especificamente, não estamos mais no plano da “política” (neste está o casamento civil!) e a discussão não será sobre “política”, ou pelo menos não deveria. A discussão será sobre Metafísica (como o casamento era – ortopraxia – como era compreendido, como é e deveria/poderia ser – ortodoxia e heterodoxia), politeologia, mitologia, etc. É esta discussão “teológica”, com profundidade (acadêmica), calma, e sobretudo honestidade, para além dos “ânimos exaltados” (doa a quem doer) que tem de ser iniciada em cada religião, e não apenas “importada” de olhos fechados dos EUA, da Islândia ou de onde for.
Comecei o texto frisando que o foco nisto tudo deveria estar na compreensão (ou decifração) da ordem cósmica em si e termino repetindo isto. Não se trata de uma discussão somente sobre os Deuses e as histórias sobre Eles que nos foram passadas, mas justamente sobre o que está além, acima, mas que projeta um reflexo nestas histórias. Também não se trata de uma discussão ética, no sentido da “ação pessoal”. Se trata, antes de mais nada, de uma discussão religiosa ampla, sobre o funcionamento metafísico do mundo (quem quiser, leia aqui “Natureza”) e de como as instituições (físicas e espirituais) dos humanos refletiam, se refletem, ou deveriam refletir (ou mesmo se não devem refletir, o porquê) este funcionamento. Se trata da reflexão sobre o que é o casamento religioso (dentro de cada tradição) e sobre as possibilidades acerca deste.
É uma discussão difícil, muito, pois pode se referir a alturas sublimes, que beiram o místico e apofático, pela própria natureza sagrada do que se acerca. É bom lembrar aos religiosos, que por mais que se busque uma abordagem cética e filosófica, o que a distinguirá de uma abordagem “externa”, será a opção existencial consciente, a crença, a fé numa visão de mundo, num centro de valores atemporal e vitalista. Crer na firmeza transcendente de nossos pilares metafísicos, pular por sobre o abismo niilista, transpassá-lo; e isto significa crer – de verdade, e não apenas como referência estética, ou adereço exótico – na sacralidade dos bosques antigos.
Por vezes, penso que os Deuses imortais devem se divertir com como fazemos “tempestades em copos d’água”, e pouco se importam para certas querelas humanas; mas tenho pra mim, que pelo menos uma parcela Deles, valorizam aqueles de nós que com afinco, tenacidade e excelência, permanecem teimosamente firmes, com uma face orgulhosa, religiosamente amparados pelas sombras de seus Ancestrais; não distraídos pelo sabor dos ventos momentâneos, mas focados em ajudá-Los, mesmo que seja com nosso diminuto contributo, na difícil manutenção da ordem cósmica, na Grande Guerra [pela manutenção do sagrado *Belyos Bitows]. É uma opção humana engajar-se, digo mais: é uma opção radical.
Achei o texto inconclusivo.
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