“O Discurso e os Atos” e a Carta de Suicídio de Dominique Venner

[Tradução de trecho da obra Un Samouraï d’Occident, de Dominique Venner. Pág 113 a 115. Para o aniversário de morte de Venner me pareceu adequado traduzir este dos trechos que selecionei, e para elucidar quem ainda não tenha compreendido o ato, adiciono a tradução da carta encontrada sobre o altar da catedral de Notre Dame junto ao corpo dele. Comentários meus no corpo do texto estão em itálico e entre colchetes]

O Discurso e os Atos

Este desprendimento não é jamais tão claro quanto no rito japonês da morte voluntária por evisceração, o seppuku. De acordo com a ciência da anatomia chinesa adotada também no Japão, a região do ventre posicionada sobre o umbigo (hara) é também  centro da vida.

O seppuku não era para os Bushi apenas uma forma de eacapar à desonra. Era também uma maneira extrema de afirmar sua autenticidade por um ato de heroísmo gratuito. Haviam aprendido a desprezar aquele que fala ao invés de agir. “Eles achavam que um único ato dizia mais do que  o mais longo dos discursos, pois o discurso pode mentir.” Eles acreditavam na sinceridade absoluta do ato supremo. Achavam que não se mente diante da morte.

Em seu ensaio A Morte Voluntária no Japão, Maurice Pinguet estabeleceu uma comparação entre o espírito da nobreza da espada japonesa, e aquele da aristocracia européia em seu outono, ao fim do século XVI e início do XVII. Não saimos intactos: “Se reconhece de todo os mesmos princípios de honradez e de serviço dos samurais, a nobreza da espada francesa não conseguiu fazer triunfar os seus valores, pois desde o fracasso de la fronde [difícil a tradução desta palavra, ao pé da letra, la fronde pode ser a arma funda ou um ataque], é uma versão burguesa da benevolência cristã que se afirma. Ela se consola gabando-se de seu farisaísmo, rindo dos hipócritas e seus tolos.” Foi o que fez La Rochefoucauld e a antiga frondosa nobreza refugiada por despeito no Jansenismo. “No Japão, a ética marcial conseguiu se impor porque dá ênfase à abnegação[…]. Aquele que coloca sua honra acima de sua vida não pode ser suspeito de mentir. Ele age, é suficiente… Esta foi a instituição do seppuku que isentava a ética marcial de toda a subordinação utilitária, que assegurava sua soberania sobre a vida… A morte voluntária vinha autenticar de sua sanção suprema toda a arquitetura das obrigações marciais.”

Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a morte voluntária alcançou no Japão uma consagração sem precedentes quando se exigiu o sacrifício jos jovens kamikases. Este nome significa ‘vento divino’, em memória ao tufão milagroso que havia dispersado em 1281 uma frota de invasores mongóis. Uma força especial aérea constituída da esperança de que os ataques suicidas aos navios americanos poderia conjurar o inevitável. O primeiro ataque teve lugar em 25 de Outubro de 1944. Ao todo, 2198 pilotos se sacrificaram: 34 navios americanos foram a pique e 288 avariados. No entanto, o poderio naval inimigo não havia se lançado seriamente. Para seu último vôo, cada kamikase levava consigo um sabre tradicional. Morte inútil? Talvez. Mas certamente não absurda. Somente a morte sofrida não tem sentido. Quando desejada, ela tem o sentido que lhe atribuímos, ainda que seja sem utilidade prática.

Esta retórica não deixa insensível a alma européia.  Ela faz vibrar uma corda secreta. Não por acaso o suicídio ritual do escritor Mishima, em 25 de Novembro de 1970, alcançou tamanho eco na França  e na Europa onde, como já dito, também cultivamos o desprendimento diante da morte.

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Gaulês de Ludovisi

Carta

Eu estou são de corpo e de espírito e pleno de amor por minha esposa e filhos. Amo a vida e não espero nada além dela senão a perpetuação de minha raça e meu espírito. Portanto, no crepúsculo desta vida, diante dos perigos imensos para minha pátria francesa e européia, me sinto no dever de agir, enquanto ainda possuo forças. Acredito ser necessário me sacrificar para romper a letargia que nos esmaga. Eu ofereço o que me resta de vida no intuito de protesto e de fundação. Eu escolho um local altamente simbólico, a Catedral Notre Dame de Paris que eu respeito e admiro, ela que foi edificada pelo gênio de meus antepassados sobre um local de culto ainda mais antigo,  que evoca nossas origens imemoriais.

Enquanto tantos homens se encontram escravos de sua própria vida, meu gesto encarna uma ética da vontade. Eu me dou a morte a fim de acordar as consciências dormentes. Eu me insurjo contra a fatalidade. Eu me insurjo contra o veneno da alma e contra os desejos insividuais invasivos que destroem nosso ancoradouro identitário, notadamente, a família, sustentáculo íntimo de nossa civilização multimilenar. Conquanto defendo a identidade de todos os povos em seus lares, eu me insurjo contra o crime que visa a substituição de nossa população [refere-se à imigração em massa].

O discurso dominante não podendo sair de suas ambiguidades tóxicas, imputa aos europeus tirar [no sentido de eliminar] as consequências. Falhando em possuir uma religião identitária, à qual nos ater, nós compartilhamos desde Homero, depositário de todos os valores sobre os quais refundar nossa futura renascença em ruptura com a metafísica do ilimitado, fonte nefasta de todos os desvios modernos.

Eu peço perdão de antemão a todos a quem a minha morte causará sofrimento, e a começar pela minha esposa, meus filhos e netos, assim como a meus leais amigos. Mas, uma vez passado o choque da dor, não duvido que uns e outros vão compreender o sentido de meu gesto e transcender a dor em orgulho. Eu desejo que isto se projete para durar.  Eles encontrarão em meus escritos recentes a prefiguração e a explicação do meu gesto.

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